Teses

Nas fraturas do vivido, des-figurar o passado: memória e imagem em Carlos Drummond de Andrade, a partir de Boitempo

Fernanda Ferrari Zrzebiela
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2020

Resumo: Dos livros iniciais à memorialística dos tempos de maturidade do poeta Carlos Drummond de Andrade, afirmou-se uma recepção crítica acostumada a pensar o percurso da sinuosa trajetória, descrita pelo gauche de Itabira, nos termos de um linear amadurecimento. Por tal perspectiva, a poesia produzida na velhice, especialmente aquela que se afirma em contiguidade às raias da memória, apresenta-se pelo signo de um justo desejo de totalização da própria história, tanto a individual e social testemunhada quanto a \”história\” poética da obra geral, na tentativa de totalização ou de reunião dos fragmentos. As múltiplas variações,no entanto, que se processam ao longo da poesia drummondiana evidenciam, pelo contrário, uma postura conflituosa, traduzida pelo sentimento de impossível reconciliação do poeta diante do tempo, e que, em certa medida, estende-se também à posição do poeta em relação à sua própria obra. Partindo do singular modo de operação descrito pela confluência de temporalidades na poesia de memória de Carlos Drummond de Andrade, notadamente aquela reunida nos três livros constituintes do que se consideram ser as \”memórias\” em verso do poeta -Boitempo I (1968), Boitempo II, Menino antigo (1973) e Boitempo III, Esquecer para lembrar (1979) -, vislumbra-se aí, infiltrada por entre a já conhecida relação de \”mundo\” e \”gauche\”, a interposição de uma terceira instância: o tempo em estado de imagem. A partir do interesse manifestado pelo poeta em pensar as relações entre ?tempo? e \”poesia\” refletidas não apenas em seu próprio exercício poético, mas também na obra de outros artistas, pretende-se investigar uma possível teoria da imagem que perpassaria, de maneira dispersa e não diretamente anunciada, a produção artístico-literária drummondiana pós-1940, a qual acabaria por (re) fundamentar a própria noção do fazer artístico, em Drummond, em proveito do trabalho da memória, que é também, e necessariamente, o trabalho da imagem.

Correspondência entre de Mário de Andrade e Henriqueta Lisboa: poesia em tempo de guerra

Rodrigo José Brasil Silva
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2019

Resumo: Esta pesquisa tem por objetivo refletir sobre a relação entre ética e estética na criação artística, tendo como ponto de partida a correspondência entre Mário de Andrade (1893-1945) e Henriqueta Lisboa (1901-1985), realizada entre 1939 e 1945, período marcado pela Segunda Guerra Mundial e pela ditadura de Getúlio Vargas. Nessa época em que as questões político-sociais se tornaram prementes, de que modo a postura ética se relacionava com a estética? Nas cartas de Mário a Henriqueta, escritas no auge de sua maturidade, predominam reflexões sobre o papel do intelectual na sociedade, a responsabilidade moral do artista, o processo de criação. A correspondência revela, ainda, aspectos do processo de criação poética de Henriqueta Lisboa e de sua busca por conciliar uma poética voltada para questões espirituais e do ser com as inovações da poesia modernista e as exigências da crítica literária da época.

Para além da frente ampla: Fernando Gasparian e a educação das elites

Jeferson Candido
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2018

Resumo: Este trabalho se detém, num primeiro momento, na trajetória de Fernando Gasparian. De modo geral, Gasparian é conhecido como o dono e diretor de Opinião (1972-1977), semanário que constitui um marco da imprensa brasileira na década de 1970 e cuja característica principal foi reunir em torno de si um amplo espectro de colaboradores no exercício de oposição à ditadura. Mas, além de Opinião, Gasparian foi um dos ideadores da revista Argumento (1973-1974), editor dos Cadernos/Ensaios de Opinião (1975-1980), adquiriu a editora Paz e Terra em 1973 e abriu, em 1979, a Livraria Argumento em São Paulo e no Rio de Janeiro. É sobre esse conjunto de realizações que nos detemos no segundo capítulo. Por fim, conjugando os capítulos anteriores, procuramos apontar um projeto editorial que, para além da “frente ampla de oposição” à ditadura, carrega também o ideal de uma “educação das elites”. Concentramo-nos, particularmente, sobre as publicações, isto é, Opinião, Argumento e Cadernos/Ensaios de Opinião. Se, no semanário, a saída quase completa da equipe original em 1975 e o fim em 1977 nos indicam os limites desse ideal subjacente apontado, a transição entre as revistas evidencia a mudança paradigmática que o acompanha.

***

Revista do livro: um projeto político, literário e cultural

Fernando Floriani Petry
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2015

Resumo: Publicada entre os anos de 1956 e 1970, a Revista do Livro era o órgão oficial do Instituto Nacional do Livro. Seu projeto foi retomado pelo Departamento Nacional do Livro – subordinado à Fundação Biblioteca Nacional – em 2002. Idealizada pelo poeta gaúcho Augusto Meyer, a revista reuniu em suas páginas nomes significativos da intelectualidade brasileira em suas diferentes fases de publicação, que coincidiram com diferentes momentos políticos brasileiros. Sua primeira fase, de 1956 a 1961, compreende exatamente o período do Governo de Juscelino Kubitschek e possui 24 números divididos em 20 volumes. Sua segunda fase, de 1964 a 1970, ocorreu durante o período da Ditadura Militar no Brasil, com 19 números publicados em 17 volumes. E sua terceira e atual fase, iniciada em 2002, coincide com a eleição de Luís Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, para a Presidência da República e recupera a sequência numérica da revista. O último número lançado, em 23 de julho de 2015, foi o 55, totalizando 12 números em 12 volumes. Diante dessa proliferação de números, optamos por realizar um recorte na definição do corpus de pesquisa para a presente tese, focando na primeira fase da revista. Assim sendo, trabalharemos com os 24 primeiros números, publicados entre os anos de 1956 e 61, ampliando o olhar para a sua fase embrionária, ou seja, para os anos de planejamento e criação do Instituto Nacional do Livro e da sua revista. A presente tese sustenta a hipótese de que a Revista do Livro atuou a partir de um projeto político, literário e cultural específico, cujos objetivos eram imaginar e selecionar as tradições que serviriam de base para (re)fundar a Literatura Nacional a partir da constituição de um cânone baseado nos grandes vultos da historiografia literária.

***

Todos os pivetes tem o meu nome: imagens da subjetividade nos arquivos de Roberto Piva

Ibriela Bianca Berlanda Sevilla
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2015

Resumo: Esta tese apresenta uma leitura sobre os arquivos deixados pelo poeta paulistano Roberto Piva (1937-2010); um deles localizado na cidade de São Paulo em posse do herdeiro dos direitos autorais, e outro, guardado no Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro desde 2006. A investigação em ambos os arquivos trouxe a descoberta de dois livros inéditos do poeta: Corações de hot-dog e Out-door. O recorte que constitui o corpo desta investigação literária está formado pela análise de notas e poemas inéditos colhidos de ambos os arquivos e pela análise de poemas do livro Corações de hot-dog. A partir das análises, constatou-se que o fio condutor para pensar a questão do arquivo e para guiar a abordagem de leitura do Corações de hot-dog é a constante utilização da imagem do garoto, colocado em diferentes contextos, principalmente eróticos. A insistente utilização desta imagem envolta em uma linguagem do êxtase, encontrada, em grande medida no livro inédito analisado, contribui para desvelar a imagem de um poeta-personagem que se mostra múltiplo, se desdobra, e se dissolve ao longo dos poemas, manuscritos e notas que compõem os arquivos. Este procedimento poético se dá através de uma série de devires: o devir-garoto do poeta, o devir-poeta dos garotos, o devir-xamã do poeta, entre outros. Estas leituras contribuem para reavaliar o que até então tinha-se considerado a obra poética de Roberto Piva, tendo em vista a grande quantidade de escritos deixados inéditos.

***

Mas é limpinha: uma poética para Francisco Alvim

Laíse Ribas Bastos
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2014

Resumo: Este trabalho tem por objetivo investigar a escrita poética de Francisco Alvim a fim de entender a configuração de uma poesia que se faz a partir da fragilidade, precariedade e tenuidade apreendidas no modo de ver o mundo, as coisas do mundo, e da vida. Serão abordados como corpus os poemas publicados desde seu primeiro livro, Sol dos cegos, de 1968, até o mais recente, O metro nenhum, de 2011. O desenvolvimento da pesquisa está estruturado sobre os principais eixos poéticos da dicção de Alvim: as implicações do reconhecimento crítico de sua poesia; a relação com o presente; a apreensão das falas alheias; e a dissimulação dos sujeitos poéticos na poesia. O movimento em torno dessas questões levará à percepção, também, de um dizer poético que conjuga tempo e espaço e se manifesta por meio de procedimentos constitutivos notadamente deixados como cicatrizes modernas na linguagem poética. A consequência da operação poética realizada a partir de tais recursos será uma poesia permanentemente tensionada e suspensa. Desse modo, a poesia, pensada como um modo de ver ainda audaz e impositivo, nos termos de Jean-Luc Nancy e Michel Deguy, implicará astúcia, força e potência.

***

A literatura de Gonçalo M. Tavares: investigação arqueológica e um dançarino sutil nas esferas O Bairro e O Reino

Júlia Studart
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2012

Resumo: Esta tese tem como proposição investigar arqueologicamente o procedimento de escrita da literatura de Gonçalo M. Tavares a partir de uma ideia que ele propõe também como política para o seu trabalho: a literatura como um corpo-dançarino entre o poder da ficção e o ensaio [como experiência intelectual livre e também como ato em si, repetição, treino] e como um pensamento sucessivo entre um passado reminiscente e um presente ativo que se apresenta como uma forma de resistência no mundo agora; a literatura como um movimento arqueológico de colisão dos tempos com o espaço e como desejo político do espírito livre e sem gravidade, quando a escrita vem, com Nietzsche, como um corpo forte que se pergunta o tempo inteiro se é capaz de dançar. Investigar os modos de operação de uma escrita que procura seguir de perto os movimentos de um dançarino sutil [conceito do próprio Gonçalo M. Tavares] e tomar para si uma mobilidade de dança a partir do uso de uma reconfiguração do espaço da história – principalmente nos projetos O Bairro e O Reino. E assim, nestes projetos, ler criticamente como esta escrita é capaz de inserir-se seguindo a morfologia esférica proposta por Peter Sloterdijk.

Publicada em livro: O dançarino subtil: Gonçalo M. Tavares entre as esferas o Bairro e o Reino (Alfragide: Caminho, 2016).

***

Baú de máscaras: o arquivo da cantora e compositora Maysa

Valentina da Silva Nunes
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2010

Resumo: Primeira tese a digitalizar e apresentar o arquivo pessoal da cantora e compositora brasileira Maysa (1936-1977), voz de destaque do samba-canção de fossa dos anos 1950 e 1960. Material composto de textos e fotos inéditas, cuja marca é a multiplicidade de forma e conteúdo, esta leitura aponta para os usos da escrita de si e da intertextualidade entre o público e o privado, como um jogo de máscaras, uma autoficção a que a arquivista recorre, para assim compor sua persona, seja levando para os palcos dados de sua vida pessoal, seja trazendo de lá elementos para seu autoarquivamento.

***

Das memórias às veredas: Revista USP – letras, cenas e sons

Lucia de Oliveira Almeida
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2008

Resumo: Esta tese tenta configurar o espaço ocupado pela literatura na Revista USP, partindo da reflexão que ali se realiza sobre a arte produzida nos anos 80 e 90. As criações recentes da música popular, do teatro e do cinema são submetidas a um balanço enquanto a literatura não recebe o mesmo tipo de abordagem crítica. Investigar as motivações e desdobramentos de tal postura por parte da revista é a principal proposição desta pesquisa, que busca desenvolver a seguinte hipótese: um vasto conjunto de ensaios publicados na Revista USP compõe um mosaico, no qual a reflexão acerca da literatura brasileira se configura através da constituição de um eixo monumental, formado por Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis e Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa. Estas duas obras sustentam e demarcam os limites do cânone proposto pela revista, que posiciona a obra de Guimarães Rosa como última baliza do ciclo criativo da literatura brasileira. Entretanto, é possível perceber algumas sombras que conturbam o desenho nítido do referido eixo. A primeira delas é Grande sertão: veredas enquanto texto neobarroco e a segunda é uma antologia de poesia brasileira publicada na revista Universidad de México.

***

Joaquim Cardozo: um encontro com o deserto

Manoel Ricardo de Lima Neto
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2008

Resumo: Este trabalho de pesquisa tenta provocar um encontro da poética de Joaquim Cardozo com o deserto. Ler o deserto como um fora, como uma contemplação, como um território sem marcas fixas e como assombração. O deserto como aquilo que pode interferir na história e interromper a catástrofe através de um pensamento da graça, de uma atenção. Uma leitura crítica da poética de Joaquim Cardozo a partir de seu procedimento com a escritura: súplica, esperança, sustentação do paradoxo e do contingente na imagem do deserto. A fala suplicante do homem trágico. Uma leitura que atravessa a produção de Joaquim Cardozo: poemas, teatro, textos sobre arte e arquitetura, a crítica de poesia e os relatos.

***

Roberto Schwarz vai ao cinema: imagem, tempo e política

Renata Telles
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2005

Resumo: Ao longo de sua carreira, o crítico literário Roberto Schwarz escreve três críticas de cinema dedicadas a 8 ½ de Fellini, Os Fuzis de Ruy Guerra e Cabra marcado para morrer de Eduardo Coutinho, que se concentram nos usos e efeitos da técnica cinematográfica, na temporalidade dúplice e na relação entre arte e política. Partindo dessas três questões, a minha análise tenta demonstrar que a possibilidade de uma leitura política do presente, o que Roberto Schwarz mais deseja, se encontra justamente naquilo que ele rejeita insistentemente: a convivência dos contrários.

***

Espectros de uma época: o debate pós-moderno no periodismo brasileiro dos anos 80

Simone Dias
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2005

Resumo: Esta tese realiza algumas interpretações sobre o debate em torno da pós-modernidade na crítica brasileira dos anos oitenta, mais especificamente, a partir da leitura dos números temáticos dos periódicos Arte em Revista, Tempo Brasileiro, Folhetim (suplemento da Folha de São Paulo) e Revista do Brasil. A primeira parte da tese apresenta uma retomada da discussão inicial sobre a indústria cultural no país; a seguir, se discutem alguns dos primeiros usos do termo pós-modernismo na crítica brasileira, caso de Tristão de Athayde, Mário Pedrosa e Gilberto Freyre. A segunda parte enfoca o mapeamento e análise do debate articulado pelos críticos nas edições temáticas dos periódicos citados, verificando-se as peculiaridades do referido debate em nossa crítica. Nos ensaios publicados no corpus analisado, persiste, em geral, uma apropriação dicotômica do debate – pró ou contra – acirrada pela discussão tardia sobre a indústria cultural, que se mescla ao debate sobre a pós-modernidade.

***

Memórias do Presente: o suplemento Mais!, da Folha de S. Paulo

Valdir Prigol
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2003

Resumo: A proposta desse trabalho é ler o Mais!, suplemento cultural da Folha de S. Paulo, a partir de uma estratégia editorial que ele utilizou exaustivamente no período de 1992 a 2002: a comemoração. Ela é acionada a partir de efemérides de morte e nascimento de autores, de publicação e de lançamentos de obras. A comemoração apresenta-se como um mecanismo liberal e tolerante na produção de memórias tendo o Autor como centro. As narrativas que ganharam visibilidade no Mais! a partir da comememoração, giraram em torno da conversão de memórias de erros do passado para um presente estável. São, assim, memórias do presente, que esquecem as leituras que o comemorado já teve. Nos textos produzidos para as comemorações, os colaboradores são constituídos duplamente pelo Mais!: primeiro, por serem convidados a responderem a uma comemoração e, segundo, por terem seus textos apresentados por uma voz que dá o protocolo de leitura. Ao dizer como devem ser lidos os textos da comemoração, esta voz os investe de um sentido único e os tira da ambivalência, inclusive quando os textos são ficcionais. Essa proposta de leitura está composta em três capítulos e pode ser lida a partir de duas partes: a primeira procura mostrar como a comemoração está materializada na composição do Mais! (Capítulo I), e a segunda dá visibilidade às narrativas que o Mais! colocou em cena através da comemoração, deslendo, de alguma forma, a primeira parte (Capítulos II e III).

***

Rapsódia de uma década perdida: o Folhetim da Folha de S. Paulo (1977-1989)

Marco Antonio Cardozo Chaga
Orientadora: Maria Lucia de Barros Camargo
2000

Além de um fichamento completo dos doze anos de existência do Folhetim da Folha de S. Paulo, esta tese realiza algumas interpretações paralelas sobre a importância que o suplemento exerceu ao longo da década de oitenta. São privilegiados os aspectos históricos, políticos e, sobretudo, literários sinalizados pelo Folhetim. A primeira parte da tese enfoca as relações históricas que estiveram na base do jornalismo voltado à formação dos leitores, destacando, principalmente, a atuação dos folhetins como fonte de aceleração, não apenas da publicação de romances, mas como reserva crítica capaz de nos fornecer uma ampla visão do passado. A segunda parte da tese enfoca as tramas literárias e o papel chave desempenhado pela psicanálise. Paralelamente à exposição de alguns dados descritivos, apresento algumas alternativas de análise das três fases que marcaram a existência do suplemento. A primeira, entre 1977 e 1979, dedicada ao divertimento; a segunda, entre 1979 e 1982, voltada ao cenário político da redemocratização; e a terceira e mais longa, entre 1982 e 1989, centralizada na divulgação de ensaios oriundos, majoritariamente, das Ciências Humanas.